Engolindo os camelos e coando os mosquitos!

Por Gutierres Siqueira, do Teologia Pentecostal 


Guias cegos! Vocês coam um mosquito e engolem um camelo. [Jesus, em Mateus 23. 24 NVI]

É interessante observar como Jesus era implacável com os fariseus e saduceus, ou seja, a classe religiosa da época. Mas ao mesmo tempo, Jesus conversava bem com os cobradores de impostos, (que eram ladrões), as prostitutas, os endemoninhados e todo “mundo que não prestava”. Aliás, Jesus tinha péssimas companhias. Agora, quando Jesus se deparava com um fariseu a coisa ficava feia. O capítulo 23 de Mateus é enorme, com 39 versículos, mas é inteiramente um sermão de Cristo contra os fariseus.

Todo fariseu tinha o costume de coar a água potável com um pano “para ter certeza de não engolir um mosquitinho, considerado o menor ser vivo impuro” [1], enquanto isso engolia camelos, simbologicamente, com grandes pecados. Tanto a mosca como o camelo eram considerados animais imundos pelos judeus. O camelo era o maior dos animais ditos impuros. Com a força dessa analogia Jesus desmascara a hipocrisia. É interessante que a frase soa como trocadilho no original aramaico, que era a língua popular na Palestina: “Vós coais um qamla e engolis um gamla” [2].

Não só Jesus, mas os profetas no Velho Testamento condenavam a religiosidade ritualista que prezava tantos detalhes e esquecia do essencial. Malaquias é um exemplo desse combate. E é sempre assim: os que prezam detalhes acabam legalistas, como lembra H. L. Ellison:

Uma coisa é se sou muito rigoroso comigo mesmo por causa do testemunho do Espírito em mim. Se, por outro lado, eu decido que preciso observar tudo que encontro nas Escrituras, por menor que seja, a experiência mostra que eu me torno cada vez mais legalista nas minhas exigências para com os outros e cada vez mais cego para as verdadeiras exigências de Deus para comigo mesmo. [3]

Daí nasce toda sorte de hipocrisia e falso moralismo. Todos nós temos um tanto de hipocrisia. Falamos muito e praticamos pouco, quando deveríamos falar menos e agir mais. Jesus é intolerante com santidade fingida. É melhor ser um sincero pecador do que um falso moralista. É um dever agir corretamente não somente com o mosquito, mas também nunca ser profano com o camelo.

É possível obedecer uma regra e desobedecer sua essência. É possível ser fiel à lei e matar o espírito dela. É possível pagar o dízimo sobre tudo e desprezar o necessitado. É possível se vestir decentemente e ainda assim ser o pior dos maliciosos. É possível ser um fervoroso evangelista e ainda assim bater na mulher. É possível coar o mosquito e engolir o camelo. Evitar pequenos erros enquanto comentemos grandes encrencas de nada adiantará.

Os camelos denominacionais
Soube por uma irmã de Pernambuco que uma garota foi disciplinada na Assembleia de Deus de Recife por seis meses (!) porque usou calça para fazer ginástica na academia (!!!). É cada uma! Nessa mesma cidade existe uma divisão ministerial terrível que impede a comunhão dos irmãos da MESMA igreja. Os legalistas veem pecado na calça de ginástica e esquecem do mundanismo divisionista. Engolem camelos, elefantes, baleias e tentam coar um mosquitinho. Atitudes simplesmente ridículas.

O respeitado teólogo James Packer lembra do absurdo que é uma igreja querer legislar costumes. Packer chama isso de “tabus comunais”:

Esse ascetismo reacionário ainda sobrevive em alguns círculos na forma de tabus comunais sobre álcool, tabaco, teatro, dança, jogos, roupas elegantes, cosméticos e itens similares. Talvez tenha havido, e haja, boas razões para tais abstinências, em se tratando de decisão pessoal, mas tabus comunais tendem a entorpecer a consciência, em vez de avivá-la... O mundanismo foi definido em termos de quebras de tabus, e identificações de consequências mais amplas com os pecados da sociedade passaram despercebidas... O pietismo separa o mundo em vez de estudá-lo e procurar mudá-lo; é hostil ao prazer, em vez de agradecido por ele, temeroso de que o mundo adentre nossos corações montado nas costas do prazer. [4]

Você pode observar que essas igrejas que legislam costumes, os tabus comunais, são as que mais têm brigas por cargos, disputas de poder, fofocas, intrigas e divisões. Elas são altamente mundanas e ainda posam de santas. A santidade passa longe desse clima de divisão. Jesus não suporta isso!

Referências Bibliográficas:

[1] BARKER, Kenneth L. (org). Bíblia de Estudo NVI. 1 ed. São Paulo: Editora Vida, 2003. p 1656.

[2] ARRINGTON, French L. & STRONSTAD, Roger. (ed.) Comentário Bíblico Pentecostal. 4 ed. Rio de Janeiro: 2006. p 128.

[3] BRUCE, F. F. (org.) Comentário Bíblico NVI. 1 ed. São Paulo: Editora Vida, 2008. p 1588.

[4] PACKER, James Ian. Os Planos de Deus para Você. 1 ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2005. p. 67.
 

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