Mais Que Um Oleiro

Mais que um Oleiro


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Vincent Cheung


NOTA: Artigo extraído da antiga versão do site www.monergismo.com; referencia fundamental em teologia reformada – não sabemos informar se o artigo consta no novo site monergismo.

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Um leitor me pediu para tratar da seguinte objeção contra a doutrina bíblica da soberania divina:

“Se Deus determina tudo o que fazemos, de forma que não somos livres dele em nenhum sentido, então não somos nada mais do que robôs e fantoches”.

Essa é uma das objeções mais comuns contra o ensino da soberania divina. O Calvinismo popular a responde atribuindo ao homem algum tipo de liberdade ou poder de “auto-determinação”, alegando que isso é de certa forma “compatível” com o controle de Deus sobre todas as coisas. Alguns calvinistas (por exemplo, A. A. Hodge, R. L. Dabney, etc.) respondem a objeção de uma forma que soa perigosamente próxima do teísmo aberto. Eles dizem que, visto que Deus conhece as disposições de suas criaturas, ele é capaz de “controlar” as decisões e ações delas manipulando as circunstâncias que as cercam, e assim, “induzindo-as” a “livremente” pensar e agir de formas que estejam de acordo com os planos de Deus.

Mas muitos desses calvinistas também percebem que essa explicação do controle de Deus sobre as decisões e ações dos homens é, de fato, logicamente incompatível com sua alegada crença na soberania de Deus. Assim, após algumas explicações e evasões iniciais, eles finalmente chamam-na de um “paradoxo” e um “mistério”. Poupariam tempo se simplesmente admitissem a auto-contradição no princípio, e a chamassem de um “paradoxo” e um “mistério” desde o início. Dessa forma todos poderiam ir mais cedo para casa.

Visto que eu rejeito o compatibilismo e a liberdade humana em qualquer sentido com relação a Deus, segue-se também que minha resposta à objeção é diferente. Pelo contrário, eu afirmo que Deus é soberano e o homem não é livre. Essa posição fornece a única resposta bíblica e racional, a qual também parece ser a resposta mais simples e mais ousada contra o desafio. E visto que eu já expliquei e defendi extensivamente o ensino bíblico da soberania divina em outros lugares,[1] eu não repetirei tudo aqui. O que se segue é uma aplicação do que eu já escrevi sobre a soberania divina à objeção acima.

Começamos notando que a objeção é incompleta. Ela falha em especificar o que exatamente nos robôs e fantoches os faz relevantes. Por que seríamos semelhantes a robôs e fantoches se Deus de fato determina todos os nossos pensamentos e ações? Quais seriam as similaridades? Então, a declaração falha até mesmo em se tornar uma objeção real por negligenciar apontar o porquê seria um problema para nós sermos robôs e fantoches. Se fôssemos robôs e fantoches, isso significaria que o Cristianismo é falso? A objeção não explica. A responsabilidade moral seria minada se fôssemos robôs e fantoches? A objeção falha em provar ou até mesmo mencionar isso.

Nós não devemos permitir que nossos oponentes escapem fazendo objeções preguiçosas e mal-terminadas. Eles assumem que entendem os assuntos e que as suas objeções são irrespondíveis. Uma das coisas que devemos fazer, ao defender a fé, é mostrar que nossos oponentes não são tão inteligentes e cuidadosos como pensam que são, de forma que, ao invés de desafiar os ensinos da Escritura, eles deveriam se humilhar diante da sabedoria de Deus.

O apologista competente deve ser capaz de mostrar que nenhuma objeção contra a revelação bíblica jamais tem qualquer sentido. Após mostrar que o oponente falha em estabelecer um desafio que demande uma resposta, visto que o próprio desafio é ininteligível e o próprio oponente nunca sabe o que ele realmente está perguntando, o apologista pode então abordar o tópico a partir de uma posição de conhecimento e autoridade.[2] Isto é, nós respondemos as objeções não porque nossas crenças são tão aparentemente problemáticas que devemos desastradamente apagar o fogo à esquerda e à direita, mas nós primeiro humilhamos os rebeldes espirituais, mostrando que eles falam coisas sem sentido até mesmo em seus protestos, e agora nós pronunciamos a esses inimigos derrotados o que Deus está dizendo por todas as Escrituras — arrependei e crede na verdade.

Sempre é possível neutralizar qualquer objeção contra o Cristianismo mesmo antes de começarmos a respondê-la. Após mostrar que a objeção é descuidada e incompleta, continuaremos para tratar do assunto de qualquer forma, mas não porque a objeção nos compele logicamente, visto que ela já foi neutralizada.

Primeiro, o fato de que Deus controla todos os nossos pensamentos e ações não nos faz robôs e fantoches, pois mesmo quando completamente controlados por Deus, os humanos são muito diferentes de robôs e fantoches. Os humanos têm mente — eles raciocinam, decidem, e se emocionam. De fato, visto que nossas identidades são preservadas mesmo quando a nossa alma se separa do nosso corpo, é mais correto dizer que os humanos são mentes que vivem em corpos.[3] Robôs e fantoches não são mentes, mas são objetos inteiramente físicos. Eles não têm pensamentos para serem controlados, mas somente partes e propriedades para serem manipuladas.

Alguns dos nossos pensamentos são ocasiões para eventos psicológicos. Não há relação inerente e necessária entre mente e corpo, mas é Deus quem diretamente controla ambos, usualmente correlacionando os dois. Todavia, ainda somos diferentes de robôs e fantoches, visto que eles não pensam de forma alguma. Os movimentos físicos deles não são ocasionados por seus próprios pensamentos, visto que eles não têm nenhum, mas pelos pensamentos daqueles que usam suas mãos e instrumentos para controlá-los. E, de fato, é Deus quem diretamente controla tudo — a mente humana, a relação entre a mente humana e corpo humano, o próprio corpo humano, e a relação entre o corpo humano e os instrumentos, os robôs e os fantoches. Isto é, na ocasião em que Deus age diretamente sobre um (por exemplo, quando ele faz com que a mente humana decida mover um dedo), ele também age diretamente sobre o outro (nesse caso, ele faz com que o dedo se mova).[4]

Lembre-se que a objeção não explica porque é um problema os humanos serem robôs e fantoches, e essa é uma razão pela qual a objeção fracassa mesmo antes de respondermos. Assim, estamos apontando as diferenças que os humanos têm contra robôs e fantoches, não porque a objeção nos compele, mas porque estamos tratando do assunto a despeito da objeção. As diferenças estão aí para serem notadas, de forma que mesmo que os humanos sejam completamente controlados por Deus, eles são diferentes de robôs e fantoches.

Segundo, embora algumas vezes implícito, a objeção falsamente faz da liberdade humana a base para a responsabilidade moral. As suposições são: (1) É necessário afirmar que os humanos são moralmente responsáveis; (2) A responsabilidade moral pressupõe a liberdade humana; e (3) Robôs e fantoches não são livres. Dada essas suposições, o objetor corretamente raciocina que, se Deus é absolutamente soberano, então os seres humanos não são livres. Então, ele assemelha esses humanos, que não são livres, aos robôs e fantoches, que também não são livres. Isso conseqüentemente significa que os humanos não são moralmente responsáveis se Deus controla todas as coisas, mas visto que é necessário afirmar que os humanos são moralmente responsáveis, isso significa que não podemos afirmar que Deus controla todas as coisas.

Nós dispensaremos primeiro um problema menos importante com esse raciocínio, que é a analogia desnecessária de humanos controlados com robôs e fantoches. Esse passo poderia ser pulado totalmente e a objeção ainda estaria intacta; de fato, ela ficaria mais clara sem a analogia. Em outras palavras, seria mais simples apenas dizer: “Se Deus controla todas as coisas, então os humanos não são livres. Mas visto que a responsabilidade moral pressupõe a liberdade humana, isso necessariamente significa que se Deus controla todas as coisas, então os humanos não são moralmente responsáveis. Mas então, visto que é necessário afirmar que os humanos são moralmente responsáveis, devemos, portanto, negar que Deus controla todas as coisas”...

O processo de raciocínio é legítimo em si mesmo, de forma que a conclusão seria correta se todas as suposições fossem verdadeiras. Contudo, nem todas as suposições são corretas, e, portanto, a objeção se desmorona. O erro fatal é assumir que a responsabilidade moral pressupõe a liberdade humana. Essa premissa é explicitamente contradita pela Escritura, e nunca foi justificada na história da teologia e da filosofia. Ela está tão impregnada na maioria dos pensadores que até mesmos quando ameaçamos mencioná-la ou considerar possíveis formas de justificá-la, eles freqüentemente apenas dizem que ela é intuitivamente conhecida e então continuam.

Mas eu já tenho repetidamente declarado em outro lugar: a suposição é falsa. Por definição, “responsabilidade” refere-se a ter obrigação de prestas contas. Em outras palavras, alguém ser moralmente responsável significa que ele está moralmente obrigado a alguma pessoa ou padrão. A questão que se a pessoa é livre ou não é irrelevante para a discussão. A única questão relevante é se alguém que tem autoridade sobre essa pessoa decidiu considerá-la obrigada a prestar contas. Visto que Deus governa sobre toda a humanidade, e ele decidiu julgar todos os homens, isso significa que cada pessoa é moralmente responsável, a despeito deles não serem livres. A liberdade humana não tem nenhum lugar lógico para nem mesmo entrar na discussão.[5] Além do mais, a única razão para afirmar que os humanos são moralmente responsáveis é, antes de tudo, por causa da mesma razão – isto é, que Deus decidiu julgar toda a humanidade.

Deus pode, da mesma forma, facilmente considerar robôs e fantoches responsáveis, não no sentido de que eles podem entender suas ações, mas no sentido de que Deus pode recompensá-los ou puni-los se ele assim desejar. Jesus amaldiçoou uma figueira por ela falhar em produzir fruto. A árvore não era livre, ou nem mesmo consciente, mas ela foi punida, e Jesus estava plenamente justificado para assim o fazer. Certamente, a árvore e a maldição eram simbólicas, mas o simbólico (que é aparente, sob a superfície) não pode contradizer o que é simbolizado, ou, caso contrário, não seria realmente simbólico para tal coisa. O fato é que, não importa qual significado mais profundo seja pretendido, a árvore falhou em produzir fruto, e Jesus a amaldiçoou por essa razão. Da mesma forma, se Deus assim se agradar, ele pode destruir um robô por não funcionar corretamente, e visto que ele é o único padrão de moralidade, ele seria justo por definição ao agir assim. Certamente ele não precisa da nossa permissão, nem precisa satisfazer nossas falsas suposições.

Em outras palavras, os seres humanos são moralmente responsáveis precisamente pela razão oposta assumida pela objeção — somos responsáveis porque Deus é soberano e nós não somos livres.

Terceiro, contrário ao seu intento, a objeção usa uma analogia que atribui muita liberdade aos humanos em relação a Deus. O objetor esperaria que o cristão explicasse como os humanos são mais livres do que robôs e fantoches, ou como os humanos têm liberdade genuína enquanto os robôs e fantoches não. Aqueles que afirmam o Calvinismo popular também tentarão afirmar a soberania de Deus ao mesmo tempo.[6] Isso satisfaz a expectação do objetor — expõe o fato de que a posição desses calvinistas é deveras incoerente e paradoxal, e que [a soberania de Deus] é afirmada por mera força, como até mesmos os principais teólogos calvinistas admitem.[7]

Contudo, se queremos deixar de lado as comuns suposições anti-bíblicas e irracionais, confrontaremos a objeção reivindicando o exato oposto. A objeção falha em se aplicar, não porque sua analogia nega a liberdade ao homem, mas porque ela concede mui pouco controle a Deus.[8] Certamente, Deus tem infinitamente mais controle sobre nós do que nós temos sobre robôs e fantoches.

Com robôs e fantoches, nós podemos apenas rearranjar e combinar materiais pré-existentes para formar objetos cujos propósitos e funções são limitados por seus materiais, por nossa inteligência e criatividade, e então por nossa habilidade de mantê-los e manipulá-los.

Isso não é assim com Deus. Quer estejamos falando de robôs, fantoches, ou humanos, Deus é aquele que cria, sustenta, e controla os próprios materiais dos quais eles são feitos. Ele é aquele que concebe seus propósitos e funções, e até então ele não está limitado a esses, mas ele pode mudá-los a qualquer hora se ele assim desejar. Ele pode criar do nada (Gênesis 1:1), mudar água em vinho (João 2:9), tornar pedras em humanos (Mateus 3:9), e humanos em sal (Gênesis 19:26). Ele pode fazer com que qualquer objeto funcione de maneiras que sejam aparentemente além do propósito original, tal como fazer uma mula falar (Números 22:28, 30; 2 Pedro 2:16), e pedras clamarem e louvarem a ele (Lucas 19:40).

À luz do testemunho da Escritura, é um insulto abominável para a majestade e poder de Deus afirmar que ele não tem mais controle sobre nós do que temos sobre robôs e fantoches, ou que temos mais liberdade com relação a ele do que robôs e fantoches têm com relação a nós.[9] Certamente, humanos são maiores do que robôs e fantoches, como já reconhecemos anteriormente. Mas então, Deus é infinitamente maior do que os humanos.

Isso nos leva a uma discussão sobre uma objeção parecida contra a soberania divina. Contudo, dessa vez a objeção não é baseada numa analogia extra-bíblica, mas ela é um ataque direto contra a Escritura. A passagem está em Romanos 9, e é suficiente citar apenas os versículos 18-21:

Portanto, Deus tem misericórdia de quem ele quer, e endurece a quem ele quer. 19 Mas algum de vocês me dirá: “Então, por que Deus ainda nos culpa? Pois, quem resiste à sua vontade?” 20 Mas quem é você, ó homem, para questionar a Deus? “Acaso aquilo que é formado pode dizer ao que o formou: ‘Por que me fizeste assim?’” 21 O oleiro não tem direito de fazer do mesmo barro um vaso para fins nobres e outro para uso desonroso?

Paulo se refere a uma objeção contra o controle total e direto de Deus dos corações humanos, incluindo seu poder para diretamente causar fé e incredulidade neles. A objeção assume que, se Deus não pode ser resistido, então os humanos não deveriam ser culpados. Em outras palavras, como muitos não-cristãos, arminianos e calvinistas inconsistentes, ela adota a suposição bíblica de que a responsabilidade pressupõe a liberdade. Nós já tratamos dessa falsa premissa.

Essa outra objeção que eu tenho em mente, parecida com aquela sobre robôs e fantoches, ataca a analogia do versículo 21. Eu me deparei com ela nos escritos de teólogos liberais que rejeitam a inspiração e inerrância da Escritura, e também na conversação com vários cristãos professos. Isto é, eles identificam a objeção contra a soberania divina no versículo 19, e consideram a resposta de Paulo no versículo 21 como falaciosa. Paulo escreve: “O oleiro não tem direito de fazer do mesmo barro um vaso para fins nobres e outro para uso desonroso?”.[10] Contra isso, eles exclamam: “Mas certamente nós somos mais do que barro e vaso!”.

Em outras palavras, eles afirmam que a resposta de Paulo falha porque sua analogia é falsa. Ele compara humanos com barro e vaso, mas humanos são mais do que barro e vaso, e, portanto, a analogia não pode explicar como os homens são mantidos como culpados sob um Deus absolutamente soberano, um que pode diretamente agir sobre a mente para causar tanto o bem como o mal. O desafio é direcionado não somente ao Calvinismo, mas à própria Escritura. Em resposta, ofereceremos os seguintes pontos.

Primeiro, o ataque contra o versículo 21 negligencia o ponto que Paulo está afirmando. Ele não reivindica que os homens são exatamente como barro e vaso de todas as formas, mas ele está lembrando seus leitores da relação entre a criatura e o Criador. No versículo 20, ele diz que a criatura não tem nenhum direito de “questionar”, e no versículo 21, ele diz que o Criador tem todo o direito de fazer tudo quanto desejar com as criaturas. A verdade do ponto de Paulo não depende de se humanos são exatamente como barro e vaso, mas de se Deus é o Criador e se os humanos são criaturas. Visto que Deus é o Criador e os humanos são deveras as criaturas, o ponto de Paulo no versículo permanece de pé.

Segundo, e isso está relacionado com o primeiro, embora Paulo possa apontar que a objeção falsamente assume que a responsabilidade pressupõe a liberdade, ele não o faz explicitamente aqui. Contudo, ele alcança o mesmo efeito respondendo a objeção da perspectiva dos direitos divinos versus os direitos humanos. A objeção continua: “Então, por que Deus ainda nos culpa? Pois, quem resiste à sua vontade?”. A resposta de Paulo é: “Deus tem o direito de fazer o que quiser com você, ou fazer tudo de você, e então ainda te considerar responsável (veja v. 22). Mas você não tem o direito de questionar”. Essa réplica, certamente, é contrária ao Calvinismo popular, o qual tende a dizer: “Deus tem o direito de mostrar misericórdia para quem quer que ele escolha, mas ele meramente deixa os réprobos de lado, que se condenam por si mesmos”. Pelo contrário, a resposta de Paulo é que a criatura não tem o direito de questionar, mas que Deus tem o direito de fazer algumas para serem objetos de misericórdia e de fazer outras para serem objetos de ira.

Terceiro, talvez cego por uma indignação humanista de que o homem tem sido reduzido à barro e vaso, a objeção se esqueceu de Deus. Fora da analogia, é verdade que os humanos são mais do que barro e vaso, mas então Deus é mais do que um oleiro!

Agora, uma analogia é uma analogia, e para uma ter sucesso, ela precisa apenas estabelecer seu ponto pretendido de uma maneira exata. A Escritura é perfeita, e a analogia inspirada de Paulo é perfeita para o seu propósito. Ela ilustra que o oleiro divino tem o direito de moldar o barro humano em qualquer tipo de vaso e para qualquer propósito que ele escolha, e a criatura não tem o direito de protestar contra o Criador.

Mas uma analogia permanece uma analogia — ela não pretende representar cada aspecto dos objetos que ela ilustra. Ao apontar isso, a objeção procura proteger a liberdade humana. Contudo, não podemos afrouxar a analogia para um objeto sem também fazer o mesmo para os outros objetos na mesma analogia; de outra forma, haveria uma tremenda distorção entre a relação desses objetos. Assim, se devemos nos desprender da analogia para considerar a verdadeira natureza do homem, então Deus também deve ser desprendido da analogia, para que possamos considerar sua verdadeira majestade e poder.

Contrário à expectação deles, uma vez que afrouxamos a analogia, a situação se torna ainda menos favorável para os nossos oponentes. Ao invés de preservar qualquer liberdade humana, a soberania plena de Deus é exposta, e todas as limitações impostas sobre o “oleiro” pela analogia são agora dissipadas. E pela mesma razão que já mencionamos quando discutimos robôs e fantoches, Deus tem muito maior controle sobre nós do que um oleiro humano tem sobre o barro e o vaso. Desprendendo-se da analogia, a objeção se move para reivindicar a liberdade do homem, mas ao invés disso, ela destrói todos os traços de liberdade humana e desvela plenamente a soberania de Deus, um poder criador e governador infinitamente maior do que qualquer oleiro humano pode exercer sobre pedaços de barro.

Quanto à responsabilidade moral, já tratamos do assunto. A verdade que é a responsabilidade moral pressupõe a soberania e julgamento divino, não a liberdade humana, e quanto mais soberano Deus for, mais certo o julgamento será. Quanto maior controle Deus tiver sobre todas as coisas, maior responsabilidade moral será estabelecida. Visto que a soberania divina é absoluta, o julgamento divino é, portanto, certo — porque Deus é soberano, haverá um julgamento. Deus é soberano e o homem não é livre. Bendito seja o nome do Senhor. Sem hesitação ou qualificação, podemos ousadamente proclamar: “Nosso Deus reina!”.


[1] Veja Vincent Cheung, Systematic Theology, Commentary on Ephesians, The Author of Sin, e Ultimate Questions.

[2] Veja Vincent Cheung, Ultimate Questions, Presuppositional Confrontations, e Apologetics in Conversation.

[3] Pedro se refere ao corpo como uma “tabernáculo” que pode ser “deixado” (2 Pedro 1:13–14; também 2 Coríntios 5:4). Veja também “The Ching Ming Festival” em Vincent Cheung, Doctrine and Obedience.

[4] Para uma explicação da metafísica assumida aqui, por favor, veja Vincent Cheung, Ultimate Questions e Captive to Reason.

[5] Eu tenho discutido isso extensiva e repetidamente em meus outros escritos. Por favor, veja Vincent Cheung, Systematic Theology, Commentary on Ephesians, e The Author of Sin.



[6]

Até mesmo “total” (ou termos equivalentes) tornou-se relativo para alguns daqueles que afirmam o calvinismo popular. Eles afirmariam que a soberania “total” contra aqueles que a desafiam, mas então dariam meia volta e me desafiariam por afirmar a soberania “total” de Deus e sua aplicação à metafísica, epistemologia e soteriologia. Eles (esses “calvinistas”) até mesmos começariam suas objeções contra mim dizendo, “Mas se Deus controla tudo... ”, indicando que eles não crêem realmente que Deus controle tudo (por exemplo, veja a seção 1 de “Short Answers to Several Criticisms” em Vincent Cheung, Captive to Reason). A verdade é que eles não crêem na soberania total de Deus — eles simplesmente crêem numa versão mais forte da soberania defeituosa de Deus do que os arminianos.



[7]

Veja “Forced to Believe” em Vincent Cheung, The Author of Sin, no qual eu uso A. A. Hodge como um exemplo desse Calvinismo incoerente. Ele escreve: “Embora a absoluta origem de qualquer nova existência a partir do nada seja para nós confessadamente inconcebível, ela não é nem um pouco mais do que a relação do pré-conhecimento infinito, da pré-ordenação, ou do controle providencial de Deus com a livre agência do homem, nem mais do que muitas outras verdades que somos todos forçados a crer”. Eu respondo: “As doutrinas bíblicas são somente inconcebíveis se mensuradas contra alguma premissa ou padrão irracional. O que precisamos fazer é deixar de lado esses falsos princípios e suposições que não fazem parte da nossa cosmovisão. Mas se você for tomar princípios e suposições de duas cosmovisões contraditórias e tentar uni-las, então, sim, você terminará com algo inconcebível. Apenas não chame isso de Cristianismo ou de Calvinismo”.

[8] Veja “Determinism vs. Fatalism” em Vincent Cheung, The Author of Sin, no qual eu respondo a acusação de que minha posição sobre soberania divina equivale ao fatalismo, observando que o fatalismo é de fato mais fraco do que o determinismo bíblico que eu afirmo — ele atribui mui pouco controle a Deus sobre a sua criação.

[9] Como uma discussão de Romanos 9 implicaria, é bom usar uma analogia para ilustrar o controle de Deus sobre sua criação num sentido relativo, mas nenhuma analogia pode representar absolutamente o controle infinito de Deus sobre sua criação. O erro, portanto, não está em se usar uma analogia para ilustrar o controle de Deus, mas em se afirmar ou implicar que a analogia representa completamente o poder de Deus.

[10] Como uma nota adicional, Paulo não diz: “Deus faz os vasos nobres dos vasos comuns”, ou “Deus faz os vasos nobres, e permite que os vasos comuns façam a si mesmos”, ou “Deus faz alguns do barro para vasos nobres, e deixa de lado o resto dos vasos comuns pré-existentes”. Não, pelo contrário, Paulo diz: “Deus faz os vasos nobres e os vasos comuns do mesmo pedaço de barro”. Assim, essa passagem oferece apoio definitivo à reprovação incondicional e ao supralapsarianismo. Não ajuda considerar o “barro” como já pecaminoso, visto que Paulo diz que Deus faz os vasos comuns dele. Ele não usa termos passivos como “permitir” ou “deixar de lado”. Os réprobos não fazem a si mesmos. É Deus quem os faz, e ele os faz como réprobos.


Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 03 de Setembro de 2005

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