A primazia aramaica e o verdadeiro nome de Jesus


Uma pergunta enviada a nossa série “Doutor Bíblia Responde”, questionava sobre qual o nome verdadeiro de Jesus. Num primeiro artigo, analisamos a tese que afirma que o nome “Jesus” é falso, e que deveríamos todos fazer uso do seu nome em hebraico, a língua dos judeus. 

Como demonstramos os próprios sucessores de Cristo, os apóstolos, traduziram nome de Jesus para o grego, o que reduz as cinzas a tese analisada. Todavia, o irmão Vinícius Pimentel, editor do excelente blog 'Voltemos ao Evangelho', sugeriu que poderíamos escrever algo sobre a Primazia Aramaica, tese que alega que o Novo Testamento teria sido escrito, originalmente, em aramaico, sendo posteriormente traduzido para o grego.

O tema é importante, pois, como lembra o irmão Vinícius, os que alegam que “Jesus” é um falso nome, costumam se apegar a tal teoria, a fim de dizer que os textos gregos que temos do Novo Testamento, ao traduzirem o nome de Jesus para outra língua (o grego), foram corrompidos.

Assim, tentam argumentar que os sucessores de Cristo jamais cometeram a “blasfêmia” de traduzirem o nome do Senhor.

Sobre tal assunto, é valioso o testemunho de um cristão judeu, que atua na evangelização dos Israelitas:

“Há uma teoria entre alguns estudantes de Bíblia, que se chama “Primazia Aramaica”, que afirma a superioridade de versões aramaicas do Novo Testamento sobre as versões gregas existentes.Esta teoria surgiu de uma visão parcial de alguns cristãos, cristão-ortodoxos, simpatizantes do movimento judaico-messiânico, interessados pela restauração das raízes judaicas e outros que estão re-descobrindo as raízes judaicas do cristianismo” [1]

Duas afirmações interessantes aqui: a Primazia Aramaica se baseia em uma visão “parcial”, e não em fatos comprovados. De fato, não conheço qualquer prova documental que sustente. Com isso não quero reduzir o valorda Peshitta, a versão aramaica do Novo Testamento, que aliás é de grande valor, mas apenas colocar a teoria da primazia em seu devido lugar.

Uma segunda afirmação que se destaca nos diz sobre o interesse de tais cristãos pelas “raízes judaicas do cristianismo”. Ora, na verdade, todo cristão sabe que a Religião Cristã nasceu numa cultura judaica, e sabem também que Cristo aboliu o judaísmo, tornando-o desnecessário para a salvação. Todavia, o que vemos em nossos dias – seja em alguns defensores da Primazia Aramaica, seja em muitos neopentecostais – é a “judaização” da fé cristã. Tais pessoas pretender dar nova vida aquilo que Cristo declarou obsoleto!

Do meu ponto de vista, um dos argumentos mais impressionantes a favor da Primazia Aramaica, alega que a Peshitta sempre foi usada por diversas Igrejas Orientais, que sempre a tiveram como sendo “originais”, nunca passando pela cabeça de tais cristãos que os apóstolos tivessem escrito qualquer coisa em grego.

“... sempre acreditaram que a Peshitta aramaica é a Palavra inspirada de Deus. Sua crença histórica é que a Peshitta lhes foi entregue pelas mãos dos apóstolos. Nunca acreditaram em algo diferente. Eles nunca fizeram uso de textos gregos”. [2]

Como a religião cristã tem seu berço no Oriente, o argumento acima ganha um grande poder de convencimento, e parece sustentar a idéia que somente anos depois, com a Igreja se espalhando para o mundo Ocidental, os cristãos teriam traduzido o Novo Testamento para o grego. Aqui temos um prato cheio para aqueles que pretendem ver, em tais traduções, a adulteração do Nome do Salvador.

Ainda que seja possível que alguns cristãos ali mantenham tal tradição, não é verdade que seja a crença de todo o cristianismo oriental. Comprovar isso é muito fácil, basta uma simples pesquisa em seus comentários bíblicos.

Em ordem cronológica, S. Mateus é o primeiro evangelista, conforme resulta da tradição. Pelo testemunho de Papias (95,165), bispo de Hierápolis na Frígia, sabe-se que escreveu em aramaico "ta lógia kyriaká," mas esta expressão, segundo o pensamento do próprio Papias, quando fala do Evangelho de S. Marcos, compreende não só os discursos, como também os fatos da vida de Jesus. Mateus não escreveu, portanto, uma simples coletânea dos discursos de Jesus, como afirmam, sem razão, alguns críticos, mas escreveu o "Evangelho do Senhor”. [3]

Assim, junto com todo o cristianismo ocidental, os cristãos orientais seguem a tradição antiga de que apenas Mateus teria sido escrito em aramaico, ao menos, algumas de suas partes. Porém, mesmo entre os judeus cristãos, o entendimento é que a Peshitta seria uma tradução do grego, e não o contrário.

“Sim, a Peshita tem algum valor crítico, mas não primazia, ainda que incomode - obviamente gostaríamos que todos os livros do N.T. fossem escritos em hebraico - porém é fato que os manuscritos mais antigos que temos para compor o N.T. ainda são manuscritos e papiros em grego. A Peshita foi escrito em caracteres “siríacos”, algo que nunca foi usado por judeus do I século, isto é indiscutível, basta consultar os milhares de achados arqueológicos com inscrições em hebraico quadrático". [4]

Com tais observações em mente, podemos concluir que aqueles que afirmar ser “Jesus” um nome falso, copiado de uma divindade pagã, firmam sua crença sobre um fundamento de areia movediça.

“Preocupa-me ver certos grupos no Brasil, fundamentando doutrinas em cima do Peshita, estes poderiam se dedicar à construção judaica a partir da proposta que fiz no tópico anterior, eliminando a “primazia”, pois o Peshita não tem palavra final em hermenêutica e crítica textual. Pois, sendo ela uma reprodução feita a partir de fontes gregas, o intérprete deve ter autonomia nesta construção, recorrendo a estas fontes”. [5]

1)     O aramaico da Peshitta não era utilizado pelos judeus dos dias de Jesus. Vide citação acima. Este fato documental, por si só, desacredita a tese de uma primazia aramaica.

2)     A maioria dos textos neotestamentáros foi escritos para gentios, de fala grega. Por isso é tão comum encontrar notas explicativas nos textos sagrados. Alguns exemplos: S. Mateus 1.23; S. Marcos 5.41, 15.34; S. João 1.38, 4.9 20.16; S. Lucas 22.1; 23.50; Atos 4.36, 9.36; dentre outros exemplos.

3)     Uma multidão de manuscritos em grego. São mais de cinco mil manuscritos do Novo Testamento descobertos pelos estudiosos. Todos estão escritos em grego. NÃO HÁ NENHUM EM HEBRAICO. Isto é prova suficiente que Todo o Novo Testamento foi escrito em grego. Até mesmo os manuscritos encontrados nas cavernas de Qumran no mar morto, atribuídos ao Novo Testamento estão em grego. Isso se torna mais importante pelo fato de que os essênios eram judeus extremistas de fala hebraica”. [6]

Um castelo de areia, assim é a casa dos hereges que querem impor aos cristãos a forma hebraica do nome do Salvador.

Notas:

[1] O que é a Peshita; em pdf.
[4] O que é a Peshita; em pdf.
[5] Idem.

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