Você é evangélico? Pense de novo!
Por Marcelo Lemos
Boa parte dos meus leitores já me viu falar sobre “deixar de
ser evangélico”. Nem todos reagem bem, o que é compreensível diante do seguinte
fato: muitos confundem um sistema religioso autodenominado ‘evangélico’ com o
próprio evangelho. Mas, o que muitos parecem não entender neste debate é que
considerar-se evangélico tem haver com uma bem definida compreensão do que é o
Evangelho de Cristo. Irei comentar alguns dados históricos e teológicos, e ao
terminar espero que o leitor pergunte a si mesmo: Sou realmente um evangélico?
Por razões históricas mais ou menos justificadas, boa parte
de nós toma o termo “evangélico” como sinônimo de “não católico”, ou pior
ainda, de “anticatólico”. Penso que é uma analise estreita do problema, e sem
muito valor teológico. No máximo, tal compreensão tenta nos dizer o que um
evangélico não faz, sem esclarecer nada sobre o que ele faz e crê. É bom saber
que evangélicos não aceitam a Infabilidade do Papa, a Intercessão dos Santos e
o valor das procissões, porém, isso não nos diz nada sobre qual é a natureza
do Evangelho.
Então, qual é a natureza do Evangelho? Foi essa a pergunta
originou a Reforma Protestante. Foi essa pergunta que dividiu o Ocidente entre “católicos”
e “evangélicos”. Lutero não se rebelou contra o Papa, nem contra os dias
santos, ou qualquer outra coisa que os evangélicos de hoje odeiam no
Catolicismo. Sim, com o tempo, Lutero acabaria combatendo tais coisas, mas não foi
isso que deu origem a Reforma. Lutero se deu conta que a Igreja, ou uma parte
significativa dela, havia perdido o significado real do que era o Evangelho. De
fato, a Religião Cristã estava envolvida em exigências e regras tão pesadas, e
vinha mesclando-se a superstições tão absurdas, que a Boa Notícia tornara-se um
grande fardo. Lutero compreendeu que a salvação dava-se exclusivamente “pela fé”,
e isso mudaria a história do Ocidente.
Se Deus é Santo, se odeia o pecado, e se o homem é tão
pecador como a Bíblia diz, que esperança temos de alcançar a salvação?
Certamente a esperança não pode estar no legalismo, nem na superstição. Nos
dias de Lutero alguns líderes da Igreja ofereciam a salvação a troco de moedas;
ritos e sacrifícios eram a oposta de outros. Lutero percebeu o erro ao
encontrar na Bíblia que a salvação era um dom, e que nascida da iniciativa de
Deus e não dos méritos do homem. “Porque
pela graça sois salvos, por meio da fé; e isso não vem de vós, é Dom de Deus.
Não vem das obras, para que ninguém se glorie” (Efésios 2.8-9).
Lutero, e os chamados Reformadores, compreenderam que o
Evangelho era extremamente simples. O Evangelho não carece de ritos, estruturas
burocráticas ou rituais místicos. O Evangelho resume-se em uma única coisa:
confiar em Cristo. Não é algo extremamente simples? De fato é. Porém, ouso
dizer que é muito mais simples do que talvez você esteja concluindo ao ler
isso. Sim, pois há o risco de confundir a confiança em Cristo com a confiança na
fé em Cristo. O Evangelho é tão simples, tão simples, que não pode sequer
ser compreendid0 com ter fé na fé!
Não precisamos ter fé na fé que temos
em Cristo para alcançarmos a salvação – apenas precisamos ter fé em Cristo! Ainda que às vezes o cristão
possa duvidar de si mesmo, ainda que possa questionar a qualidade da sua fé
pessoal, se ele de fato compreende a simplicidade do Evangelho, não questionará
a fidelidade de Cristo! Ainda que sua fé seja pequena, frágil e capaz de
dúvidas, o cristão joga-se nos braços de Cristo. Se entender isso, compreendeu
a simplicidade do Evangelho. “Se formos
infiéis, ele permanece fiel; não pode negar-se a si mesmo” (II Timóteo
2.13).
O Arcebispo Tomas Cranmer, um dos mais importantes Reformadores
da Igreja da Inglaterra, escreveu sobre isso. “A nossa fé em Cristo nos diz isso: ‘Não sou eu [a sua fé pessoal] quem
paga os seus pecados, senão somente Cristo; e somente a Ele te envio para tal
propósito, esquecendo até mesmo as tuas boas obras, palavras e pensamentos, e
colocando tua confiança apenas em Cristo!’”(1). É importante compreender isso: não é a fé quem nos salva, mas
a fé em uma pessoa, o Cristo! Dito de outro modo, Cristo é quem nos salva, e a
fé é o caminho pelo qual Deus nos conduz a Seu Filho.
Que isso tem haver com ser evangélico? A resposta talvez
esteja enublada pela extrema confusão dos nossos dias. Nossos evangelistas
pregam as mais variadas e criativas regras para a salvação: desde não tomar
Coca-Cola a não escutar Bossa Nova. Nossos pastores nos convencem do valor e da
eficiência de ritos como tomar água “orada”, comprar lenços ungidos e coisas
semelhantes. Que isso tem haver com ser evangélico? Absolutamente nada, pois
nada disso tem haver com tudo aquilo que expusemos até agora! É decepcionante
ter de fazer tal denúncia, mas o fato é que a Igreja Evangélica de hoje prega
tudo, menos o Evangelho. Parece contraditório, mas “deixar de ser evangélico”
pode ser uma manifestação de desejo por voltar a ser, de fato, “evangélico”.
Uma multidão de evangélicos troca de salvação mais vezes que
de camisa. Se estão bem consigo mesmos sentem-se salvos, mas se estão
deprimidos, se percebem que cometeram alguma falha, sua confiança se esvai.
Eles se sentem salvos hoje, mas nada garante a respeito de seu próprio futuro.
A salvação para eles é algo que depende o que fazem para Deus. Eles acreditam -
ainda que não confessem - que a salvação depende de seus próprios méritos. Não
são herdeiros de Lutero.
Outros seguem inabaláveis em suas convicções anticatólicas.
Porém, isso não lhes impede de acreditar na infabilidade de pastores ou
levitas. Combatem a idolatria e a superstição dos outros, mas são incrivelmente
tolerantes com suas próprias blasfêmias contra o Evangelho. Não são herdeiros
da Reforma!
A pergunta que fica é uma só: você é evangélico? Uma
pergunta ariscada, que talvez mostre ao leitor que uma resposta positiva não
obriga ninguém a estar preso ao sistema que se apoderou do título.
___________
(1) Você
pode ler todo o sermão de Tomas Cranmer, numa tradução para o português
disponibilizada gratuitamente pela Latimer
Press, clicando AQUI.
Gostaria que você considerasse também os seguintes trechos: Mt 7(todo ele) Mt 28.19,20 18(RA):Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra.
ResponderExcluir19 Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo;
20 ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado, ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado,ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século.
1Co 6.9,10; 9.27; Gl 5.18-25 Ef 5. 5,6 ou melhor ainda, também o livro de Arthur W. Pink "Estudo Sobre a Fé Salvífica" . Sou Cristão: Jesus Cristo, o Filho de Deus, é minha religião.
Marcos Ribeiro.
ResponderExcluirUm dos problemas de nós evangélicos é que esquecemos de olhar para o nosso próprio umbigo.
Olá irmão Marcelo.
ResponderExcluirMandei agora a pouco para o contato neste site um convite para participar de um "debate" no genizah, do dia 15/04 com o tema "Cirilo I o patriarca do photoshop".
Abraços.
Rilda Santos
Olá, Marcelo.
ResponderExcluirTenho procurado uma igreja, ou um grupo de pessoas que tenham este olhar para o "ser cristão", para o que é Jesus no contato conosco e outras reflexões que nos/me ajude a entender e crer de dentro pra fora e incondicionalmente.
Me sugere alguma coisa além da busca individual?
Ps: moro no Rio de Janeiro...
ResponderExcluirMarrie; paz e bem.
ResponderExcluirOlha, fiz questão de responder com um artigo:
http://www.olharreformado.com/2012/05/eu-acredito-na-igreja.html
Abraços!