Orei Para que os Evangélicos Ouçam o Papa Bento XVI

Ouçam o Papa Bento XVI

Marcelo Lemos


Antes de ascenderem a fogueira permitam que este herege justifique a ‘heresia’ do título; portanto, me dêem, ao menos, mais algumas linhas...

Primeiro, começo afirmando meu gosto pela Liturgia. É verdade que a cada dia que passo estudando o tema, mais o meu ‘gosto liturgico’ (acho que acabei de cunhar uma nova expressão) se aprimora, o que é natural; no entanto, desde os meus dias de ‘pentecostal’, na minha sempre querida Assembléia de Deus, eu já tinha bom gosto por este aspecto tão fundamental da vida cristã. Sim, não se deixem enganar pelas más linguas, pois os assembleianos possuem, ao contrário do que muitos dizem, uma liturgia bem definida, e até rica em se tratando de um culto pentecostal.


Segundo, manifesto, mais uma vez, meu desapreço pelos cultos evangélicos que estão se tornando cada dia mais comuns e concorridos: antropocentricos. O termo ‘liturgia’ significa algo como ‘serviço publico’, que no caso da Ekklésia, vem a ser o ‘serviço comunitário de adoração a Deus’. Quando a Igreja de Cristo se reúne para adorar ela está realziando um ‘serviço’. Este é o significado de ‘culto’.

De fato, os termos bíblicos traduzidos como ‘culto’ possuem esta conotação. Por exemplo,
“Quando, pois, tiverdes entrado na terra que o Senhor vos dará, como tem prometido, guardareis este culto. E quando vossos filhos vos perguntarem: Que quereis dizer com este culto? Respondereis: Este é o sacrifício da páscoa do Senhor, que passou as casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu os egípcios, e livrou as nossas casas. Então o povo inclinou-se e adorou. E foram os filhos de Israel, e fizeram isso; como o Senhor ordenara a Moisés e a Arão, assim fizeram” - Êxodo 12.25-27.

Traduzindo de forma mais literal o texto diria: “... guardareis este serviço... que quereis dizer com este serviço?”.

Você, alguma vez, já parou para pensar no Culto Público em termos de um “serviço” religioso, de adoração, que você oferece a Deus? Se ainda não o fez, nunca é tarde para começar. Pois resta-nos responder, então, a seguinte pergunta: que tipo de serviço é realizado no culto? É o culto um momento no qual nós servimos a nós mesmos, ou estamos ali, como servos, para realizarmos e oferecermos um serviço de adoração a Nosso Senhor e Redentor?

Eis aqui o cerne da minha contenda contra a maioria dos cultos evangélicos que tenho presenciado: são centrados no homem, e não em Deus! Alguns especialistas em ‘marketing da fé’ recomendam em livros, palestras e vídeos sobre ‘crescimento de igreja’, que o Ministro deve manter sua Igreja sempre ‘na moda’, para que possa atrair um maior público, especialmente entre os jovens. A Igreja, agindo assim, a semelhança de qualquer boa loja de departamento, molda-se de acordo com o ‘gosto do freguês’.

Não que eu seja contrário a um cuto (litugia) inculturado; mas apenas que desaprovo quando a preocupação é o querer do homem, e não o querer de Deus. Não tem haver com inculturação, nem contextualização - tem haver com uma teologia adequada do que vem a ser o culto cristão.

Terceiro, justifico o motivo da minha oração, citando trechos de obra de Ratzinger, ‘Introdução ao Espírito da Liturgia’, na qual ele analisa alguns problemas que as vezes deixamos passar batido quanto o assunto é a adoração pública, na Igreja.

Quando a Liturgia se torna mera brincadeira...
“A história do bezerro de ouro alerta para um culto autocrático e egoísta em que, no fundo, não se faz questão de Deus, mas sim em criar um pequeno mundo alternativo por conta própria. Aí, então a Liturgia se torna mera brincadeira. Ou pior: ela significa o abandono do Deus verdadeiro, disfarçado debaixo de um tampo sacro.” (RATZINGER, Joseph. Introdução ao Espírito da Liturgia. Paulinas: Prior Velho (Portugal), 2006, p.16)

“Este culto torna-se uma celebração da comunidade para com ela própria; ele é uma auto-afirmação. A adoração de Deus torna-se num rodopio em volta de si próprio: o comer, o beber, o divertir-se; A dança em volta do bezerro de ouro é a imagem do culto à procura de si, tornando-se numa espécie de auto-satisfação frívola.” (RATZINGER, Joseph. Introdução ao Espírito da Liturgia. Paulinas: Prior Velho (Portugal), 2006, p.16)

Quando a Liturgia se torna diversão de gênero religioso...
“A dança não é uma forma de expressão cristã. Já no século III, os círculos gnósticos-docéticos tentaram introduzi-la na Liturgia. Eles consideravam a crucificação apenas como uma aparência: segundo eles, Cristo nunca abandonou o corpo, porque nunca chegou a encarnar antes de sua paixão; consequentemente, a dança podia ocupar o lugar da Liturgia da Cruz, tendo a cruz sido apenas uma aparência. As danças cultuais das diversas religiões são orientadas de maneiras variadas, invocação, magia analógica, êxtase místico; porém, nenhuma dessas formas corresponde à orientação interior da Liturgia do “sacrifício da Palavra”. É totalmente absurdo, na tentativa de tornar a Liturgia “mais atraente”, recorrer a espetáculos de pantominas de dança, possivelmente com grupos profissionais, que muitas vezes, terminam em aplauso. Sempre que haja aplauso pelos aspectos humanos na Liturgia, é sinal de que a sua natureza se perdeu inteiramente, tendo sido substituída por diversão de gênero religioso.”(RATZINGER, Joseph. Introdução ao Espírito da Liturgia. Paulinas: Prior Velho (Portugal), 2006, p.147)

“Sempre que haja aplauso pelos aspectos humanos na Liturgia, é sinal de que a sua natureza se perdeu inteiramente, tendo sido substituída por diversão de gênero religioso”.É verdade que o livro de Ratzinger, hoje Bento XVI, é mais voltado para o contexto católico romano, e também de interesse para aqueles evangélicos que seguem uma tradição Higt Church ou Broad Church; todavia, de modo geral, ele aponta problemas que estão ainda mais visiveis nas práticas culticas mais populares entre os ‘evangélicos’ de nosso tempo!

Igrejas-teatros; pastores-atores; pregadores de auto-ajuda; bajuladores; cultos show; adoração show; oração show...

Adoradores do aplauso, do elogío, das cameras e das luzes...

Adoradores do próprio umbido, servos do próprio ventre!
“Irmãos, sede meus imitadores, e atentai para aqueles que andam conforme o exemplo que tendes em nós; porque muitos há, dos quais repetidas vezes vos disse, e agora vos digo até chorando, que são inimigos da cruz de Cristo; cujo fim é a perdição; cujo deus é o ventre e cuja glória assenta no que é vergonhoso; os quais só cuidam das coisas terrenas” - Filipensses 3.17-19.

Quem tem ouvidos para ouvir, ouça!

Paz e bem!

Obs: este texto está sendo publicano em uma nova 'categoria' do nosso blog: Liturgia Reformada.

Citações extraídas de ‘A Vida Sacerdotal’.

5 comentários :

  1. Pastor Marcelo,

    É, realmente parece que muitos devem ouvir o Bento, afinal papa por "papa" ele tem mais experiẽncia que o Terranova.

    Ótimo texto.

    Ednaldo.

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  2. Concordo!!Papa por papa, o deles é bem mais sabio!!!Isso sem contar q temos varios!!!!!

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  3. A questão não é a igreja católica perder seus fiéis para as igrejas evangélicas, mas sim os adeptos ao catolicismo estão tendo seus olhos abertos para as escrituras sagradas.
    Digo isso com experiência, pois por toda a vida fui católico praticante a ponto de me batizar, fazer a primeira comunhão, ser integrante do grupo de jovens, estudar em colégio coordenado por freiras e ir a missa algumas vezes por semana. Entendo a posição dos irmãos católicos ao repudiar os evangélicos e as doutrinas bíblicas por eles seguidas. Quando católico eu tinha o mesmo posicionamento e não suportava a idéia daqueles crentes chatos, que se achavam os donos da verdade virem falar de JESUS pra mim e querer me convencer dos meus pecados e me mostrar que eu estava indo pelo caminho errado.
    Sempre fui curioso em relação as histórias de JESUS e a história da igreja católica desde a sua criação até os dias de hoje. Gostava de pesquisar bastante sobre esses assuntos. Daí percebi o quanto a Igreja católica se desviou dos seus fundamentos iniciais durante toda a sua trajetória, inventando doutrinas que nem mesmo são citadas nas escrituras sagradas ou por elas são abominadas.
    Percebi o erro que estava cometendo ao permanecer numa religião que não mais defendia a palavra do SENHOR em sua integralidade e essência. Ficava decepcionado a cada versículo bíblico que lia e não entedia os por quês das mudanças radicais no paradigma doutrinário adotado pelo catolicismo. Percebi então que a revolta protestante iniciada por Lutero e suas 95 teses (95 pontos identificado por ele que eram adotados pelo catolicismo sem nenhuma base nas Escrituras) , tinha como objetivo trazer as pessoas novamente ao cristianismo como nos tempos dos apóstolos, um cristianismo puro, centrado em CRISTO e que seguia as doutrinas bíblicas verdadeiramente.
    A questão não é a religião, pois independente de qual seja, são feitas e compostas por pecadores que nem mesmo tem poder para salvar suas próprias vidas. Jesus não veio fundar religião, mas ser a maneira de nos religar a Deus através do seu sacrifício pessoal. O papel da igreja é a comunhão com os irmãos e a vivência das verdades bíblicas. Não devemos levar em conta a tradição familiar, isto é pregar outro evangelho.
    Foi então que conheci melhor a Igreja evangélica que procura trazer ao conhecimento de todos as escrituras sagradas e as doutrinas nelas contida. Entendo a resistência dos irmãos da igreja católica e os amo, mas ao menos procurem conhecer melhor as escrituras e as doutrinas tidas como verdadeiras lá encontradas (nas escrituras) e tenho certeza que, o que aconteceu comigo também acontecerá com você. Isto é inevitável para aqueles que amam a DEUS acima da religião e tradições familiares.

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  4. Tico,

    Você coloca as coisas como se a igreja católica fosse totalmente anti-biblica e as muitas igrejas evangélicas fossem totalmente bíblicas.

    Na verdade muitas das igrejas sustentam inúmeras doutrinas e práticas que são fundamentas em invenções ou em supostas revelações recebidas por seus lideres (Pastores, missionários, bispos, apostolos, paipostolos, patriarcas, etc.).

    Na verdade as 95 teses de Lutero não são uma lista de pontos doutrinários equivocadas da igreja católica, mas uma argumentação contra comercialização da fé. Essas teses podem muito bem serem usadas hoje para
    combater muitas coisas que são feitas em igrejas "evangélicas".

    Para ser um cristão bíblico não precisamos desprezar as coisas boas que existem no catolicismo Romano.

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  5. Vandim; concordo plenamente. Caso Lutero revisse hoje, suas 95 Teses seriam pregadas a porta da maioria absoluta das Igrejas que conhecemos.

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