Querido Agostinho
Rev. Marcelo Lemos
Querido
irmão Agostinho (vou chamá-lo assim em homenagem a St. Agostinho,
inspiração da fé reformada, e quem sei que o irmão tem lido...),
um dos meus motivos de contentamento no Senhor é ter a oportunidade
de falar a pessoas que, como eu, já sofreram sob as garras de um
religião legalista, seja onde for, no Pentecostalismo ou em outro
lugar. Talvez você já tenha lido uma série de cartas que escrevi a
uma outra amiga, “Cartas a Lene”, na qual eu busco, com minhas
limitações, explicar alguns fundamentos da fé cristã, sob a ótica
da Reforma. Mas, caso não tenha lido, talvez seja interessante dar
uma olhada.
Provavelmente
eu não conseguiria falar de tudo que li em sua carta, até porque
algumas questões são bem existenciais, e somente o Espírito Santo
pode lidar com isso. Seja como for, sua carta me tocou bastante, e eu
me vi nela em praticamente todas as linhas, inclusive em sua busca de
conforto no ateísmo, deserto no qual eu também pisei. Felizmente,
Deus mesmo revela a nós a única fonte de Esperança, que é Seu
Filho. Por isso Jesus mesmo definiu a sua mensagem como “evangelho”,
ou seja “boas notícias”. Mas, não era “um” evangelho
qualquer, mas “O Evangelho”. Talvez saiba que esse termo já era
bem conhecido no mundo antigo, e as pessoas estavam acostumadas a
ele. Elas, por exemplo, poderiam utilizá-lo ao falar do fim de uma
guerra, ou o retorno de um filho. Ou seja, havia vários evangelhos,
várias boas noticias, como hoje também. A esperança anunciada por
Cristo é algo tão maior, e tão mais sublime, que não se pode
listar junto as qualquer outra noticia, seu convite aos homens é “O
Evangelho”.
Bem,
já naquele tempo algumas pessoas achavam que era coisa de lunático,
até mesmo seus parentes duvidaram. E ainda hoje precisamos responder
a essa pergunta: Cristo foi um lunático, ou era realmente o Filho de
Deus? Pela fé, a mensagem de Cristo é simplesmente a coisa mais
importante que um homem pode ouvir. Na verdade, é a única coisa
importante, e faz compensar todo o resto. Vamos dar um olhada?
“Todo
aquele que o Pai me der virá a mim, e quem vier a mim eu jamais
rejeitarei. Pois desci dos céus, não para fazer a minha
vontade, mas para fazer a vontade daquele que me enviou. E esta é a
vontade daquele que me enviou: que eu não perca nenhum dos que
ele me deu, mas os ressuscite no último dia...” (João
6:37-39).
“Eu
lhes dou a vida eterna, e elas jamais perecerão; ninguém as poderá
arrancar da minha mão. Meu Pai, que as deu para mim, é maior do
que todos; ninguém as pode arrancar da mão de meu Pai” (João
10:28-29).
“Bendito
seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo! Conforme a sua
grande misericórdia, ele nos regenerou para uma esperança viva, por
meio da ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma
herança que jamais poderá perecer, macular-se ou perder o seu
valor. Herança guardada nos céus para vocês que, mediante a
fé, são protegidos pelo poder de Deus até chegar a salvação
prestes a ser revelada no último tempo” (1 Pedro 1:3-5).
“Pois
estou convencido de que nem morte nem vida, nem anjos nem demônios,
nem o presente nem o futuro, nem quaisquer poderes, nem altura nem
profundidade, nem qualquer outra coisa na criação será capaz de
nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor”
(Romanos 8:38-39).
Quando
me vi num beco sem saída, quase me largando por mera indecisão nos
braços do agnosticismo, foram essas palavras que me salvaram. O
Espírito Santo simplesmente disse: “Haja luz!”, e eu me lançei
nos braços de Cristo. Hoje chega a ser divertido lembrar da sensação
de pensar: “Meu Deus! Como eu não vi isso antes! Quanto tempo eu
perdi?”. Foi uma experiência realmente marcante. Para um jovem que
cresceu cultivando um medo monstruoso de Deus, e para quem a salvação
era conquistada como que por meio de barganhas infindáveis com o
Inatingível, quando entendi que “Aquele que nem mesmo seu
próprio Filho poupou, ao invés disso, o entregou em nosso favor,
como não nos dará também com ele todas as coisas? Se é Deus quem
os declara justificados, quem intentará acusação contra os
escolhidos de Deus?” (Romanos 8.32.33). Você assistiu ao filme
um “Um Grito de Liberdade”? O filme é baseado numa história
real, acontecida na Africa do Sul, e conta a corrida desesperada de
um homem para fugir do regime que iria matá-lo. É simplesmente
desesperador. Contudo, no fim, o herói, já quase desiludido, sem
forças, praticamente resignado a aceitar o fim inevitável, levanta
os olhos e o que vê? Seus olhos encaram um lindo horizonte, e sua
alma se embrigada com o cheiro da Liberdade... Aquele fugitivo
condenado era eu, e também você.
Algo
muito parecido relata o grande reformador Lutero. Assim como muitos
evangélicos de nosso tempo, o monge agostiniano vivia atemorizado,
cercado por uma religiosidade popular que sufocava a graça do
Evangelho, e fazia com que ele constantemente duvidasse de sua
própria salvação. Sempre me impressiono ao pensar nisso, e lembrar
que existe uma semelhança incrível entre a ignorância daqueles
dias com a de hoje. O pior é que os evangélicos de hoje deveriam
defender o que herdaram de Lutero, não é mesmo? Voltemos ao relado
de Lutero; sua conversão também foi um sonoro Grito de Liberdade:
“Minha
situação era que, apesar de ser um monge impecável, eu me punha
diante de Deus como um pecador perturbado por minha consciência e
não tinha confiança de que meus méritos poderiam satisfazê-lo...
Noite e dia eu ponderava, até que via conexão entre a justiça de
Deus e a afirmação de que ‘o justo viverá pela sua fé’.
Então, entendi que a justiça de Deus é a retidão pela qual a
graça e a absoluta misericórdia de Deus nos justificam pela fé. Em
razão desta descoberta, senti que renascera e entrara pelas portas
abertas do paraíso. Toda Escritura passou a ter um novo significado
[...] esta passagem de Paulo tornou-se para mim, o portão para
o Céu”.
Assim
como hoje, nos dias de Lutero as pessoas lutavam com uma visão
equivocada do Evangelho, e uma noção incompleta da Graça, e da
justificação, enfim. Gosto de um caso ocorrido com o reformador,
que já contei aqui no blog num artigo que escreve para outra pessoa,
no qual um senhora escreve a Lutero, desesperada querendo saber se
poderia ter certeza da sua salvação. A resposta de Lutero para
Barbara Lisskirchen
é maravilhosa, mas infelizmente não a vemos na maioria dos púlpitos
de hoje!
“A
mais sublime de todas as ordens de Deus é esta, que mantenhamos
diante de nossos olhos a imagem de seu Filho querido, nosso Senhor
Jesus Cristo. Todos os dias ele deve ser nosso excelente espelho, no
qual contemplamos o quanto Deus nos ama e quão bem, em sua infinita
bondade, ele cuidou de nós ao dar seu Filho amado por nós. Desse
modo, eu digo, e de nenhum outro, um homem aprende a lidar
adequadamente com a questão da predestinação. Será
evidente que você crê em Cristo. Se você crê, então será
chamada. E, se é chamada, então muito certamente está
predestinada. Não deixe que esse espelho e trono de graça seja
quebrado diante de seus olhos [...] Contemple o Cristo dado por nós.
Então, se Deus desejar, você se sentirá melhor”.
Não
faz sentido que aquele que crê em Cristo se perca em especulações
infindáveis. A Bíblia ordena que creia, e ele crê. Você crê em
Cristo? Pergunta Lutero. Se a resposta é positiva, então estás
salvo! Parece bom de mais para ser verdade, eu pensava! Mas é
simplesmente a linguagem da própria Escritura!
Porque pela
graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom
de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie; (Efésios
2:8-9)
Quem
nEle crê não é
condenado;
... (João 3:18)
... os
que dantes conheceu também os predestinou para serem conformes à
imagem de Seu Filho,
a fim de que Ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos
que predestinou a estes também chamou; e aos que chamou a estes
também justificou; e aos que justificou a estes também glorificou.
(Rom 8:28-30)
“Se
formos infiéis, ele permanece fiel; não pode negar-se a si
mesmo.” (2Tm
2:13)
Infelizmente,
e mais uma vez voltamos à mesma tecla, o evangelho de muitos hoje
passa longe disso. Estamos sendo constantemente avaliados
quanto aos bens que possuímos, os jejuns que fazemos, o estilo
musical que preferimos, quantos dons temos, se falamos ou não “em
línguas”, se fomos batizados num rio ou numa banheira, e assim por
diante. Mas tudo que o Evangelho diz é: “Creia
no Senhor Jesus, e serás salvo!”.
Ainda
que o nova vida implique, por natureza, em muitas mudanças e
transformações, ela não precisa de nada além da fé para começar.
Ela só precisa que alguém, por mais pecador possa ser, creia que
Jesus é o Salvador. Qualquer um que tenha fé em Cristo, será
salvo.
Existe
um certa tentação ao escrever estas linhas a você, Agostinho. Eu
poderia apontar os abusos da Igreja dita “evangélica” em nosso
País, ou desmandos pastorais, a hipocrisia de muitos fiéis, o
legalismo de quase todas as pregações. Mas que fruto isso lhe
traria? Mais decepção? Mais uma dose em sua taça de desengano,
talvez? Como isso seria aquém do Evangelho! Porque
ainda que você um dia venha a perder toda sua esperança, em todas
as coisas ao seu redor, a uma única boia você precisa estar
agarrado: “Quem
nEle crê não é
condenado;
...” (João 3:18).
Meu
conselho é que você leia cada uma dessas passagens, duas ou três
vezes, ou quantas vezes achar necessário para digerir o quanto são
incrivelmente cheias de segurança e certeza. Ao ler, dobre seus
joelhos e pergunte a Deus se essas palavras são verdadeiras.
“Senhor, mostre-me se essas palavras são verdadeiras!” Eu vou
orar por você, e com você. Nessa primeira semana de Maio inteira,
sempre as 00:00. Pode escolher outro horário se quiser. Leia e faça
essa oração quantas vezes precisar. Se quiser, pode terminar sua
oração com o Kyrie Eleison, uma das orações mais antigas da
Igreja: “Senhor,
tem misericórdia de mim! Cristo, tem misericórdia de mim! Senhor,
tem misericórdia de mim”.
Não
sei quando vai acontecer, talvez agora mesmo, mas você fará essa
oração a Deus:
“Cristo,
conheço meus pecados, o Senhor também; conheço minhas duvidas, o
Senhor também; mas sua palavra disse que qualquer um que crer em Ti
será salvo. Senhor,
creio em Ti.
Senhor,
tem misericórdia de mim! Cristo, tem misericórdia de mim! Senhor,
tem misericórdia de mim. Senhor,
creio em Ti!”.
Essa fé é a única esperança para a minha alma, e para a sua também. Amém.
Graça e paz rev. Marcelo.
ResponderExcluirTexto emocionante. Estamos orando também. Deus continue usando suas sábias, simples e profundas palavras.
Rilda.