O Papa veio! E daí?
Rev.
Marcelo Lemos
Muita
gente não sabe, mas o fato de existir hoje uma tradição cristã
chamada de “evangélica” tem a ver com um Papa. E ainda mais a
ver com um certo monge agostiniano, de nome Martinho Lutero. A
Reforma que teve lugar no Ocidente começou, de modo oficial, em
1517, quando esse monge desafiou a Igreja de Roma a respeito das
indulgências. Tendo Lutero literalmente fixado suas 95 Teses na
porta de Wittenberg, ou se esse detalhe é apenas uma lenda
posterior, o fato é que seu protesto mudou o curso da História no
Ocidente.
Antes
do Século XVI houve outros movimentos reformistas, e muitos heróis
da fé. Tenho
preferência por dois deles, mas creio que muitos 'evangélicos' irão
torcer o nariz com minhas escolhas. Tenho em mente dois servos de
Cristo que jamais romperam com a Igreja de Roma, a saber, São
Francisco de Assis e São Benedito
de Núrcia (São
Bento).
Esses
homens reformaram tanto a espiritualidade da Igreja em seus dias como
a sociedade a sua volta. Como
anglicano, sinto-me
honrado em fazer parte da Comunidade
de Jesus,
onde cristãos de diferentes confissões podem viver a
espiritualidade beneditina ou franciscana.
Mas
os dias se tornariam mais duros, e alguns reformadores seguintes
acabariam nas mãos da Inquisição. Não tenho qualquer preconceito
exagerado contra a Inquisição, e gostaria de lembrar que os
protestantes também tiveram as suas. Mas homens
como John
Wycliffe
(1320-1384), John
Huss (1360-1415),
Savonarola
(1452-1498), William Tyndale (1494-1536) apenas
desejaram
uma Igreja melhor, e
mais
santa. Normalmente
os historiadores classificam esses homens como pertencendo ao período
pré-reforma.
Seja
como for, a Reforma como a conhecemos hoje aconteceu nos rastros de
Lutero. O Papa Leão X achou a tese do monge agostiniano, a respeito
da Justificação “somente” pela fé, uma ameaça, a condenou
como heresia, e deu a Lutero a chance de se arrepender. Mas Lutero
não tinha do que se arrepender, e foi excomungado. Nascia a Igreja
Reformada.
E
aqui estamos nós, na edição brasileira da Jornada Mundial da
Juventude.
Assistindo
a peregrinação de Francisco, o Papa, pelo Brasil, pude notar o
quanto a Reforma foi necessária, e ainda é. Vi, por exemplo, o Papa
beijando imagens, sem se preocupar que em nosso País isso
normalmente debanda para a idolatria, indo contra o ensino oficial do
catecismo romano. Se a situação é melhor em outros países eu não
sei, posso apenas apenas dizer que o catolicismo popular no Brasil,
geralmente contradiz o catecismo. Por outro lado, condenou a
idolatria ao Dinheiro, o que é uma grande sacada, e uma espada no
coração dos pregadores da Teologia da Prosperidade, e de outros,
sejam políticos ou empreendedores. Mas penso que faltou condenar a
idolatria às imagens, que o catecismo sozinho não tem conseguido
tirar do coração de muitos cristãos romanos.
Apesar
disso,
a
peregrinação do Papa entre nós deveria deixar muitos
“evangélicos” envergonhados. O
que
vi foi alguns se movimentando para protestar contra a vinda do Papa,
alegando que dinheiro público não deveria favorecer a Igreja de
Roma. A
raiva “laicista” destes em nada difere da que
move as
mulherzinhas da “marcha da vadia e
dos vadios”,
que, num País decente, a esta hora estariam se masturbando, não com
imagens sacras,
mas com as barras de ferro do xilindró.
Os
leitores mais sensíveis me desculpem...
Da
parte evangélica,
seus
mais furiosos protestos
vinham justamente daqueles que jamais se negam
receber ajuda do Estado, ainda
que
um
simples microfone.
O
pastor Juanribe Pagliarin,
por exemplo, escreveu
uma carta indignada,
alegando
que os
evangélicos no máximo conseguem “um palco” do poder público -
“Como
as Igrejas Evangélicas no Brasil não recebem benesses oficiais
desse vulto (no máximo, o governo municipal, estadual e federal
colabora com palco e som para os nossos eventos), as lideranças
evangélicas consideram isto um privilégio injusto e inaceitável”.
Ora, desde quando o erro se mede por
quanto além você foi? Se
tais pastores realmente acreditam em Estado laico, não deveriam
aceitar privilégio algum. O protesto da inveja é mera hipocrisia.
Além
disso, na pior das hipóteses o Papa pode ao menos alegar que é
Chefe de Estado, o que é fato; os pastores invejosos são chefes de
que? Alguns, como Edir Macedo, segundo o Ministério Público, é
“chefe de quadrilha”, e seus fiéis são tidos, pelo mesmo
Ministério Público, como “vitimas de estelionato”.
Olhando por esse lado, eu prefiro o Papa Francisco, que está tendo a
ombridade de encarar os escândalos de sua própria Igreja como
homem, de frente, sem meias palavras. Ele está acima de criticas?
Não. Estou apenas dizendo que ele é mais cristão que muitos que se
acham no direito de criticá-lo.
Parabéns
para aqueles pastores e evangélicos que não gostaram de ver seu
dinheiro financiando a Igreja de Roma, e também não aceitam que o
Estado financiem seus projetos pessoais. Esses tem minha admiração.
Já
era previsível que o Papa recusaria toda a pompa que, como Chefe de
Estado, teria direito. Infelizmente, me lembrei com tristeza das
vezes que fui em reuniões de alguns conselhos de pastores. Todos nós
sabíamos que algumas cadeiras eram reservadas para os “grandes”,
mesmo que ficassem toda a reunião vazia. Também sabíamos que
alguns dos “grandes” só compareciam em época de eleições...
Faz alguns anos que não vou a tais reuniões, será que o quadro
mudou? Será que hoje, ao terminar os trabalhos, os “grandes”
descem do pedestal para cumprimentar os “pequenos”, ou
simplesmente indicam em qual banca comprar o “material ungido”,
que, com bastante sorte, fará dos pequenos “gente grande”
também? A grandeza de certos líderes “evangélicos” também
é... previsível!
Provavelmente
alguém irá me acusar de defender um idolatra. Mas será tão
simples? E quanto a idolatria a imagens e ícones dos “evangélicos”?
Boa parte é tão idolatra quanto muitos romanistas: arca da aliança,
óleos consagrados, sabonetes milagrosos, rosas ungidas, vales de
sal, e outras invenções da Pastores Metralhas. Sobre estes, digo
que além de idolatras, são hipócritas por criticarem os católicos
romanos. Claro, conheço evangélicos que, com honestidade, tem feito
criticas a Roma. Gente que mantém bravamente os princípios da
Reforma, e justamente por isso não critica apenas Roma, sua critica
se estende ao evangelicalismo fétido que se espalhou em nosso País,
feito uma praga enviada diretamente do Inferno. Ironicamente, os
sinceros críticos de Roma hoje, na maioria dos casos, se ofendem
quando chamados de... “evangélicos”. O tempora o mores!
Por
fim, fiquei surpreso e feliz quando, em sua última entrevista, o
Papa lembrou que alguns teólogos vem dizendo, desde a Idade Média,
que a Igreja precisa sempre se reformar. Não sei se o Papa realmente
se esqueceu de quem é essa máxima, mas o fato é que foram os
Reformadores Protestantes quem levantaram essa bandeira. Ecclesia
reformata semper reformanda.
Com
isso, os Reformadores estavam dizendo que a Igreja constantemente
precisa olhar-se no espelho das Escrituras, a fim de ver o quanto se
afastou dela e ser capaz de voltar, ou seja, reformar-se. Em outras
palavras, para os protestantes originais, a Reforma da Igreja nunca
está completa, pois ela é feita por pecadores. É maravilhoso saber
que o Papa tem alguma
consciência
disso. E é desesperador saber que os “evangélicos” não estão
dando a mínima para isso.
O
Papa veio, e daí? Bem, cabe a cada um de nós, que estamos separados
de Roma, perguntar a si mesmo: ainda temos razão para existir, ou
Lutero pregaria suas 95 Teses na testa dos nossos pregadores? Para
alguns, voltar para Roma seria bem melhor que permanecerem no abismo
que se meteram.
Rev.
Marcelo Lemos, diácono da Igreja
Anglicana Reformada,
e editor do blog Olhar
Reformado.
A participação de Francisco consistiu numa grande ironia, constatando que o povo brasileiro permanece místico e não efetivamente seguidor do cristianismo histórico. Malgrado os dados do último censo realizado pelo IBGE evidenciarem o crescimento expressivo dos evangélicos e pseudoevangélicos, estamos distantes do legado da Reforma original.
ResponderExcluirSe a revolução capenga (superficial - sim, as bases corrompidas de Roma estão mantidas, além da aproximação do Papa com a Teologia da Libertação ser implícita[certa saudade de Bento XVI nesse momento - rsrs] de Bergólio espanta a muitos, onde está o contraponto protestante ?
Infelizmente, o presente contexto do evangelicalismo nacional é caracterizado pela repulsa ao conhecimento teológico profundo, técnico, consubstanciado no ignorar àqueles comprometidos com as Escrituras.
Logo, interessante reviver, cotidianamente, o espírito reformado, mediante estudo e prática constante da Palavra e daquilo produzido a partir da sabedoria que dela advém, com muita humildade e responsabilidade. Assim, conseguiremos apresentar a Verdade aos próximos.
Sua Santidade o Papa Francisco já sempre foi contra o radicalismo da TL...O fato de ele ser a favor de uma Igreja mais voltada para os pobres, não significa ser contra os dogmas da Igreja e sua hierarquia legitimamente constituída...Outra coisa. Não vou entrar aqui na costumeira acusação de que a Igreja Catolica não é seguidor do Cristianismo histórico...porque efetivamente o Cristianismo histórico é a Igreja Catolica desde os primórdios e todas as igrejas que vieram depois, beberam de suas fontes e raízes...abç..Helder
ExcluirA igreja romana continua a mesma: Tudo, menos Cristã.
ResponderExcluirO "papa" beijar a imagem é só uma demonstração do compromisso dele com Cristo, nenhum!
Ele "concedeu" Indulgência aos participantes dos encontros! A mesma indulgência que motivou a Reforma e me motiva a ser Protestante e não "evangélico!"
O "ecumenismo" de roma só é vivido pelos pastores ecumênicos! roma não cede um milímetro e os "crentes" vão atrás.
A "missa" é o ponto central do romanismo. E a "missa" é a pior idolatria do "cristianismo" de roma. Querem repetir o sacrificio que foi realizado de uma vez por todas e pior: fazer o povo adorar um pedaço de trigo!
Será que podemos considerar roma parte do cristianismo?!
Caro Paulo, o fato de o papa Francisco beijar a imagenzinha de Nossa Senhora, expressando sua devoção pessoal pela Mãe de Deus, não quer dizer jamais que ele não tenha compromisso com Cristo. A saber ficou célebe a sua fala inicial quando ainda no aeroporto, diante da Dilma e de todos os brasileiros: "Eu não tenho ouro nem prata, mas trago o que de mais precioso me foi dado: Jesus Cristo. E é em seu nome que eu venho...' Quanto à sua critica desrespeitosa à Santa Missa, vale lembrar que a nossa crença no santo sacrifício da Missa é uma questão de doutrina e de fé baseada nas palavras do Sumo e Eterno Sacerdote, Jesus Cristo e que portanto, você deveria no mínimo respeitar, por educação...Seus termos aqui foram hostis e não contribui para boa convivência...além de ser um contra testemunho para o mundo cristão e não cristão.
ExcluirPaulo, a igreja católica é uma instituição que permanece por quase dois mil anos. Toda a pessoa que estuda um pouco de história da igreja, sabe que o cristianismo foi influenciado por diversos segmentos religiosos inclusive pagãos. A pergunta provocativa que te faço é a seguinte: Pode ser dizer que os seguidores de Silas Malafaia, Marco Feliciano e outros pastores midiáticos são seguidores de Cristo ou de Mamon?
ResponderExcluirSilas Malafaia, Marco Feliciano, Caio Fábio etc, serão julgados pelo senhor; Já estão causando muitos males à Igreja hoje; espero que possamos ver isto em nossos dias. Mas o "papa" é o anticristo mais antigo do mundo, sem dúvida, ou beijar a imagem não é nada? (aquilo foi só comercial?), Ele conceder indulgência aos participantes dos encontros também me diz muita coisa!
ResponderExcluirPedro, Cheio do Espírito Santo (o que no catolicismo que dizer que o que Pedro disse naquele momento é dogmatico, lei imutável), disse que "não há outro nome, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos - Atos capítulo 4.8 e 12.
Paulo ensinando o Pastor Timóteo, diz que só há "um só Mediador entre Deus e os homens", 1Tm 1.3 e 1Tm 2.5.
O próprio "papa" é considerado um mediador! a quem vamos preferir, o Mediador que o Senhor nos deu ou estes outros postos por religiosos posteriores sem conhecimento da Palavra de Deus, ou desprezando-a?
Será que o "papa" declarou alguma vez que só Jesus Cristo salva?
Paulo, sua fala é cheia de ódio, preconceito e falta de amor ao próximo...é impressionante como as pessoas agridem o papa de "anticristo"...uma figura publica, que veio em nome de Deus...e só traz mensagens de amor e de esperança, para católicos e não católicos...Por isso, já dizia Cristo Jesus: nisto conhecerão que sois meus discípulos, se vos amarem uns aos outros"(jo 13,35)...Mas o que vemos é só contra testemunho de cristãos se gladiando contra si mesmos...é uma pena que o mundo não conheça mais de Cristo, por causa da hipocrisia, maldade no coração de certos cristãos. Deus te abençoe e te ajude a se converter pra Ele. Abç Helder
ExcluirCaro Ver Marcelo Lemos, discordo da sua posição do que seja idolatria a postura do Papa Francisco, beijar a imagem de Nossa Senhora Aparecida, pois na imagem somente lembramos da mãe de Deus e expressamos por meio dela o amor e carinho que temos pela Mãe de Deus. Infelizmente os evangélicos não assimilam que adoramos somente a Deus e este gesto não configura adoração...No entanto achei notável a sua posição quanto à visita do Papa Francisco e as duras criticas que recebeu o santo padre, de lideres, ditos evangélicos...Achei oportuna e gostaria de agradecer sua mente aberto neste ponto, pois muitos não enchergam o enorme bem que trouxe o papa para todos os cristãos do Brasil e não somente católicos...pois como ele disse, usando as palavras do apostolo Pedro, seu predecessor e primeiro papa: "não tenho ouro nem prata, mas trago o que de mais valioso me foi dado: Jesus." E é em seu nomeque eu venho...Abç Helder
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